terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

O Passo do Caranguejo


            Estou na contagem regressiva para retornar ao carnaval de Macau depois de 5 anos de ausência. O nascimento da minha filha me levou a procurar alternativas mais pacatas como Pirangí e Itamaracá. Para min foram cinco anos de saudades, confesso que nos primeiros cheguei às lágrimas ao ouvir músicas que me remetiam as nossas então enlameadas ruas. Procurava acompanhar a distância, saber das novidades, participar das “resenhas pós-carnavescas” junto aos amigos e parentes que participaram da festa. A grande novidade do quinquênio era o “Vai pipocar o frevo” (participei do primeiro). Macauenses “da gema” reunidos na nossa emblemática Praça da Conceição viviam o verdadeiro espírito momesco mantendo viva a nossa cultura de maneira sadia, pacífica e limpa. Artistas da terra capitaneados pelo nosso querido Leão Neto cantavam e encantavam os foliões macauenses, perpetuando a boa música brasileira e transferindo de geração a geração a história dessa que é a maior festa do Brasil. Agora que estou voltando à ilha tenho a ingrata surpresa da suspensão do evento. Que decepção!

            Que motivos nefastos levaram os nossos mandatários a tão equivocada decisão? O carnaval brasileiro é certamente uma das principais manifestações culturais do nosso povo e um dos motores da indústria do turismo, seja ele regional, nacional ou internacional e este, o turismo, atrai pessoas ávidas por conhecer o patrimônio artístico, arquitetônico, gastronômico, cultural de um povo ou região. Durante a minha ausência tive a oportunidade de conhecer o carnaval pernambucano, um dos ícones nacionais, lá nativos e visitantes se divertem ao som do frevo e do maracatu diante de monumentos históricos, cantando antigos e novos sucessos, mas fiéis a tradição, vestindo as cores do seu estado e reverenciando blocos e personagens centenários. Esse apego às raízes dá aos pernambucanos identidade cultural, cidadania e até um certo orgulho, e esses valores se traduzem em estímulo ao turismo fazendo de Pernambuco um dos destinos mais procurados da temporada. A diversidade garante entretenimento a todos os foliões, são vários pólos distribuídos não só na cidade do Recife, como em todo o estado. E o que vemos aqui na terra do “já teve”?  O passo do caranguejo! Macau recua para a aculturação, emprenhando pelos ouvidos a cantiga da “Destaque”. Abadá, corredor da folia, Axé music numa imitação grotesca de um modelo enlatado que é reproduzido de norte a sul do país em cidades que não tem tradição carnavalesca, fazendo o “fora de época” mais fora de propósito do calendário. Digo isso por que sempre tivemos o maior carnaval do estado sem precisarmos macaquear a pequena burguesia natalense, nosso carnaval sempre foi recheado de diversidade, blocos como os Sombras, Os Bruxos, As almas, A Cobra, O Boi e tantos outros eram formados por grupos de amigos, famílias e pequenas comunidades dando cores e sons diversos que juntos formavam o magnífico mosaico cultural que fez da nossa cidade a primeira do estado no item folia. Hoje o que vemos são gigantes monopolizadores como o Jardim e a Equipicão, que se por um lado motivam grandes levas de foliões por outro esvaziam as iniciativas populares e carreiam recursos públicos para instituições privadas que a essas alturas já estão bem grandinhas para se auto-sustentarem. Por outro lado a cultura do mela-mela parece estar perdendo o controle. Eu saio no mela! E gosto muito. Mas era uma das alternativas oferecidas pela diversidade dos nossos antigos carnavais e havia limite. Sou do tempo que até no trio era possível brincar sem se “melar” e outros eventos interessantes aconteciam na cidade a revelia do Trio, como já citei os pequenos blocos diurnos e seus assaltos.  A defesa da cultura e da história de um povo não é saudosismo, pelo contrário aponta para o futuro, sem memória estaremos fadados ao esquecimento e ao imitarmos modelos enlatados perdemos a nossa identidade e passamos a ser “mais um” perdendo a graça e o encanto. Mas ainda há esperança, segunda de carnaval estaremos nas ruas fazendo do Cordão da Fantasia o nosso foco de resistência cultural.